Blog do Ronaldo Evangelista

Categoria : Play

Victor Rice + Bixiga 70
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Ronaldo Evangelista



Victor Rice, baixista e engenheiro de som novaiorquino radicado em São Paulo há alguns anos, tem uma sensibilidade massa para mixagens – um ouvido dub mas com um recorte muito próprio para montagens, registros e camadas. Ao vivo se apresenta com gravadores de rolo e mesas de som, ultimamente mais tempo dentro de estúdios, cuidando por exemplo do som do último disco de Marcelo Camelo e do próximo de Mallu Magalhães. Instalado no 29º andar do Copan, mixando e finalizando por esses tempos as gravações do álbum de estreia do Bixiga 70, aproveitou para colocar no ar esses dubs ao vivo de “Desengano da vista”, “Luz vermelha” e “Tema de Malaika”, passeando pelos naipes de sopro, solos de piano elétrico, delays de guitarra, grooves de baixo, levadas de bateria e percussão.


Billy Blanco (1924-2011)
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Ronaldo Evangelista

A Bossa Nova foi uma avalanche. A modernidade de Tom Jobim e o poder de criação de João Gilberto foram tão intensos que toda a música feita na primeira metade do século XX imediatamente ganhou ares de pré e quase todas as moderníssimas revoluções dos anos 50 se perderam no bolo entre a geração 78 rotações e a grande novidade do LP, popularizado no fim da década.

Falar a real não era exatamente comum nas eras de ultraromantismo chic ou derramado, deboches e regionalismos pop – basicamente o escopo do consumo geral. A crueza emotiva sem cortinas de Dolores Duran e a casualidade leve e jazzística de Johnny Alf, por exemplo, eram pequenas revoluções em si mesmo, que hoje em dia só não caem no balaio generalizante de precursores-da-bossa-nova aos ouvidos de um seleto clube de ouvintes mais direcionados (ou saudosistas).

Billy Blanco, falecido nesta sexta-feira aos 87 anos, tinha um senso de humor fora do comum. Não exatamente no sentido de rir da vida, rá-rá-rá, que havia também uma boa dose de existencialismo nos seus personagens e situações. Mas naquele sentido de ironia fina, observação ácida, presença de espírito, sarcasmo romântico. Pra que orgulho? O infarto lhe pega, doutor, e acaba essa banca. Parece simples, mas pensa bem: entre as músicas da época, a maioria não dizia nada.

Os elementos de casualidade, os tais precursores, visão um passo adiante, eram vários: suas melodias quase faladas, o samba balançado e cotidiano, a ingenuidade maliciosa, as crônicas de situação e insights da vida. “A banca do distinto”, composição sua de 1959, é uma obra-prima no desenrolar da letra:

a vaidade é assim, põe o bobo no alto e retira a escada
mas fica por perto esperando sentada
mais cedo ou mais tarde ele acaba no chão

mais alto o coqueiro, maior é o tombo do coco afinal
todo mundo é igual quando o tombo termina
com a terra por cima e na horizontal

Sem prejudicar hoje o bom crioulo de amanhã, não acredite em tudo o que lê, confie no que ouve. O que dá pra rir dá pra chorar, questão só de peso e medida. Três momentos favoritos de Billy Blanco, play abaixo.


Dolores Duran – A banca do distinto (1959)


Jorge Veiga – Estatutos de gafieira (1956)


Originais do Samba – Canto chorado (1969)


vai vai vai vai vai
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Ronaldo Evangelista

Depois de gravar os seus famosos três primeiros álbuns, em 59-60-61, João Gilberto em 1962 não só foi a Nova York representar o melhor do melhor ao tocar no Carnegie Hall como se internacionalizou também em breve participação na trilha do filme franco-ítalo-brasileiro Copacabana Palace.

João no auge da sutileza do canto e no máximo de suingue do violão, curiosamente fazendo cena para uma festa dançante sessentista (com uma Carmen surreal). A música, a novíssima “Só danço samba”, com Os Cariocas (saída do mesmo show coletivo com Tom e Vinicius onde nasceram “”Garota de Ipanema” e “Samba da bênção”), em prévia da versão que João faria no ano seguinte com o sax de Stan Getz.

As harmonias vocais (agudas, graves, abertas, dissonantes) dos Cariocas são chocantes, especialmente sobre a base zen do violão do João (e um breve “vai vai vai vai vai” aos 2m31s), mas a cereja do bolo é a caidinha que João dá com a voz aos 36 segundos, de resumir toda sua genialidade em um suspiro – enquanto canta sozinho uma vez antes do grupo vocal entrar rasgando. Gravado para a bande originale do filme e só lançado na França em um EP (ou “compacto duplo”).