Blog do Ronaldo Evangelista

Arquivo : Itamar Assumpção

Cruzando a Cidade
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Ronaldo Evangelista

Em comemoração ao aniversário de 458 anos da maior cidade do Brasil e sexta maior do mundo, a apresentação especial Cruzando a Cidade, sob direção artística de Maurício Fleury e Ronaldo Evangelista, traz recortes e retratos que mostram vários momentos, lugares e estilos musicais da metrópole. O show revela-se como um passeio mostrando altos e baixos, depressões e altos-relevos da cidade cinza através do encontro de diferentes gerações de músicos, compositores e intérpretes. Recuperando composições do inconsciente coletivo urbano em uma ocupação do imaginário de São Paulo através das canções, o espetáculo apresenta repertório de surpresas bem achadas de ode à cidade, em novidades e releituras que apresentam os vários lados e diferentes contradições do caleidoscópio que vivemos diariamente. Ginásio do SESC Ipiranga, 18h (qua) e 21h (qui).

Dia 25/01: MAX BO, DONA INAH, MAURICIO PEREIRA, LUISA MAITA E KIKO DINUCCI
Dia 26/01: MAX BO, TULIPA RUIZ, JAIR RODRIGUES, LURDEZ DA LUZ E LEO CAVALCANTI


(foto do ensaio com Leo e Tulipa no Traquitana por Cris Scabello)

Não é amor, é identificação absoluta, cantava Itamar Assumpção em “Persigo São Paulo”. Ideia e canção centrais para o roteiro do espetáculo Cruzando a Cidade: não é exaltação, é observação afetiva. Recortes e momentos variados, visões do trajeto que fazemos diariamente indo ou voltando do trabalho, capturados por cenas inusitadas ou simplesmente devaneando, relembrando a história dessas calçadas pisadas por milhões de cidadãos a cada minuto.

Todas as músicas guardam relação com a cidade e, principalmente, com o momento em que ela vive. Encontros e desencontros amorosos, a pé pelas ruas, estão presentes em “Trovoa”, cantada por seu autor Mauricio Pereira – relida em disco pelo Metá Metá de Kiko Dinucci, foi uma das mais emocionantes interpretações do ano de 2011. Kiko, por sua vez, apresenta composições inéditas que chama de vinhetas e funcionam como polaróides de episódios urbanos, às vezes num paradoxo sentimental possível apenas numa cidade como São Paulo.

A região central da metrópole é um dos personagens principais do show. Na voz rouca e atemporal de Dona Inah (figura única da música paulistana há pelo menos cinco décadas), representando a tradição do Bixiga em “Praça 14 Bis” (de Eduardo Gudin). Na interpretação de Lurdez da Luz (que já traz um bairro do Bom Retiro no nome), atualizando uma página importante da história do rap brasileiro com “Centro da Cidade” (de MC Jack) – originalmente da coletânea de 1988 Hip Hop Cultura de Rua, que definiu os rumos do hip hop a partir dos encontros no Largo de São Bento.

Cada dia mais inevitável em São Paulo, o trânsito na cidade é tratado no show com a ironia necessária para a sobrevivência no caos, como na lógica pedestre do antigo hit de Skowa & a Máfia, “Atropelamento e Fuga”. “Tudo Parado na City”, de Tatá Aeroplano, cantada por Leo Cavalcanti, coloca as angústias do deslocamento (ou sua impossibilidade) em contraste com o maravilhado imigrante de “Passeio” (de Belchior), por entre os carros na rua da Consolação. Visões poéticas marcam presença na Zona Oeste na voz de Luisa Maita e na inusitada canção sobre o “Amor na Vila Sônia” (de Rodrigo Campos).

A disputa pelos holofotes é vista com humor através de “Delírio, Meu!” (composição de Luiz Tatit, originalmente na voz de Ná Ozzetti com o Grupo Rumo), cantada por Tulipa Ruiz, e “Rapaz da Moda” (de Evaldo Gouveia e Jair Amorim) na voz de Jair Rodrigues lembrando um antigo hit de si próprio. Já a dor que o progresso impõe aos menos favorecidos é retratada em versão do clássico absoluto “Saudosa Maloca”, do centenário Adoniran Barbosa.

O mestre de cerimônias do evento e nosso guia pela metrópole, Max B.O., também oferece em música seu comentário sobre a atitude necessária para combater as adversidades presentes no cotidiano da cidade: “não basta ser forte, tem que ser fortaleza”, de sua própria “Fortaleza”, que ganha nova versão no show. A grande banda é formada por Mauricio Fleury (piano elétrico e direção musical), Tony Gordin (bateria), Fábio Sá (baixo), Marcelo Dworecki (guitarra), Décio 7 (percussão), Cuca Ferreira (sax barítono), Daniel Nogueira (sax tenor) e Richard Fermino (trompete).

Como encontros casuais pelas esquinas, a interação entre intérpretes é algo que acontece naturalmente com o envolvimento de artistas tão múltiplos em seus interesses. No palco, entre ocupações de diferentes imaginários da sexta maior cidade do mundo, a festa é grande com surpresas, lembranças e histórias comemorando os 458 anos de São Paulo.


Melhores de 2011: Cris Scabello
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Ronaldo Evangelista

J DIlla / Miguel Atwood-Ferguson – Timeles: Suite for Ma Dukes (2010)
The Biggest Dancehall Anthems
Erasmo Carlos – Carlos, Erasmo (1971)
Serge Gainsbourg – Aux Armes et Caetera (1979)
Jorge Ben – Big Ben (1965)
World Psychedelic Classics 3 – Love’s a Real Thing
Gana Soundz
Bixiga 70
Anelis Assumpção – Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa
Itamar Assumpção – Sampa Midnight (1986)
Secos e Molhados – Secos e Molhados (1973)
Peter Tosh – Mystic Man (1979)
Ney Matogrosso – Sangue Latino (1982)
Paulo Vanzolini – Onze Sambas e Uma Capoeira (1967)
Mulatu Astatké – Timeless (2010)
Lucas Santtana – Sem Nostalgia (2010)
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Em 2011 Cris Scabello lançou o álbum de estreia do Bixiga 70 e aparece em Sou Suspeita Estou Sujeita Não Sou Santa, de Anelis Assumpção, e Taxi Imã, de Pipo Pegoraro.
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Mais melhores de 2011 por aqui.


Melhores de 2011: Pipo Pegoraro
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Ronaldo Evangelista

Menahan Street Band – Make the Road by Walking (2008)
Juçara Marçal, Thiago França e Kiko Dinucci – Metá Metá
Romulo Fróes – Um Labirinto em Cada Pé
Karina Buhr – Longe de Onde
Kassin – Sonhando Devagar
André Mehmari & Gabriele Mirabassi – Miramari (2009)
Vampire Weekend – Contra (2010)
Erasmo Carlos – Carlos, Erasmo (1971)
Metronomy – The English Riviera
Kenny Werner – Balloons
Itamar Assumpção – Caixa Preta
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Em 2011 Pipo Pegoraro lançou o álbum Taxi Imã.
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Mais melhores de 2011 por aqui.


Beto Villares na Casa do Núcleo
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Ronaldo Evangelista

De hoje, quinta, a sábado, na Casa do Núcleo Contemporâneo de Benjamin Taubkin, espaço no Alto de Pinheiros, centro cultural de música, acontece temporada de Beto Villares, apresentando canções de seu possível segundo disco, com convidados como Anelis Assumpção e Marcelo Pretto. Excelentes Lugares Bonitos, álbum de 2003, primeiro de Beto, é uma joia rara – e todo seu trabalho no Ambulante Estúdio é coisa fina, incluindo os discos que produziu de Céu e Siba e Itamar. Considerando seu toque-de-ouro de tranquilidade sensível e como são poucas suas apresentações ao vivo, dá pra dizer que é imperdível.


Itamar Assumpção, mais ou menos organizado
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Ronaldo Evangelista

Eu seu novo blog de escritos sobre cinema, Kiko Dinucci comenta Daquele Instante em Diante, o documentário de Itamar:

Não é à toa que o filme começa em tom investigativo. Seus personagens vasculham os mais remotos arquivos pessoais para o público tentar desvendar o que foi a passagem desse artista pelo século XX, dono de uma obra intensa e original, a frente de seu tempo (ainda) e que desafiou as estruturas da indústria fonográfica e da própria linguagem da música popular brasileira.

Suzana Salles, Alice Ruiz, Luiz Waack e Alzira Espíndola aparecem no início do documentário procurando arquivos sonoros, manuscritos, matérias de jornais. A investigação será a principal ferramenta de Velloso para conduzir o filme, do começo ao fim, ele mostrará arquivos de áudio, vídeo, fotos, shows, entrevistas, reproduzindo de certa maneira a investigação dos personagens iniciais. Suzana Salles mostra o seu fichário e avisa: estão mais ou menos organizados. Parece ser a ordem de como Velloso irá expor os seus arquivos. Para Itamar, “totalmente organizado” seria uma prisão. O “mais ou menos organizado” abre o leque para a surpresa, o inesperado, e é isso o que acontece.

Embora o filme tenha uma narrativa linear, não se rende ao convencional. O diretor opta por uma narrativa polifônica, assim como os arranjos e composições de Itamar. Vozes sobrepostas, sons de cenas futuras ou anteriores invadindo o começo e o fim das cenas e um incrível diálogo das canções de Itamar com os temas sugeridos pelos depoimentos. Fica evidente nesse caso a observação de Luiz Tatit, que diz que Itamar vem de uma leva de artistas que não distinguem a sua obra da vida real. Eis o que faz as canções entrarem no filme como uma linha de costura entre as cenas.

Tem mais, segue por aqui.


Itamar Assumpção e Isca de Polícia ao Vivo no Teatro Funarte, 1983
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Ronaldo Evangelista

Comemorando a estreia do documentário Daquele Instante em Diante, esta semana, sobre Itamar Assumpção, logo abaixo em cinco partes registro inteiro de show que fez em 1983 no Teatro Funarte, com repertório baseado em seus dois essenciais primeiros discos (Beleléu Leléu Eu e Às Próprias Custas S.A.), acompanhado da banda Isca de Polícia: Suzana Salles e Virgínia Rosa nas vozes, Gigante Brasil na bateria, Paulinho Lepetit no baixo e Luiz Rondó Monteiro na guitarra. Clássico da reprise da Cultura e agora do YouTube.


Com suas canções redondas e de fluência orgânica, misterioso como um poeta beat do pop new wave brasileiro aliás paulista, de “Oh! Maldição” do Arrigo à sua “Amanticida”, passando pelo sósia de Roberto Carlos, Itamar começa de visu até comportado, de macacão preto e camisa bufante amarela, e pelo caminho pega a guitarra pra um groove rápido.


Que black navalha você, Beleléu. “Luzia” vem com lero-lero-lero-lero, e depois “Embalos”. Itamar estilosíssimo de óculos escuros e roupa já vermelha, com sua música teatral, esperta, onde tá sua malícia? Com seus causos de São Paulo de ponta a ponta, cabe samba dos anos 30, formatos e dinâmicas rock dos anos 60, funk elétrico dos anos 70, pós-tudo dos anos 80.


Um dos melhores momentos, “Se eu fiz tudo”, pérola, cantada pelas meninas, mais “Denúncia do Santo Silva Beleléu” e o clássico “Escurinho” (de Geraldo Pereira), em versão itamarassumpçãozada. E agora, como é que fica afinal? Esta música, este funk, este samba, este rock n’roll, este jazz. Fica assim, uma nega.


Não venha querendo você se espantar: já de peito nu e jaqueta azul de nylon, Itamar comanda sua obra-prima em reggae (etc) Nega música – recentemente regravada pelas cariocas do Tono, veja você -, aqui cantada pela Virginia, enquanto Suzana abraça Itamar, que assiste tranquilo. Pra fechar o bloco Itamar canta paixão, solidão, canto de guerreiro, “Prezadíssimos ouvintes” (de seu terceiro álbum, Sampa Midnight). Quero agora cantar na televisão. Mas quem é me garante que esses microfones sempre funcionarão?


Denise Assumpção vem participar de outra obra-prima: “Beijo na boca”. A vida não é mais que, se resume, vale mais? Pensei que você não ia mais me largar. Nu da cintura pra cima, com seus óculos escuros, Itamar aproveita pra criar um clima de intimidade com a câmera, conversar com operador, editor e público em casa e comanda orquestra de palmas na audiência, até cansar, pra fechar.


Instante em Diante
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Ronaldo Evangelista

Esse papo de maldito não tá com nada. Itamar Assumpção era um artista particular, cantor muito interessante, compositor de grandes momentos, figura gigante de sua própria história, sui generis e para todos. Seu som não vinha derivado de movimentos ou planos, mas mais fruto da busca do que de mais interessante tinha a oferecer, música artesanalmente costurada sobre riffs e linhas e beats de baixo e crônicas de canto falado com achados poéticos da vida de todo dia, da rua de toda noite, do romântico e do malaco, do esperto e do ingênio, do sofisticado e do mundano.

Com o recente lançamento da Caixa Preta, pelo Sesc, com todos os seus discos (e mais alguns), Itamar, falecido em 2003, anda mais vivo do que nunca. E agora, esta semana, estreia pelos cinemas o documentário Daquele Instante em Diante, de Rogério Velloso, com filmagens pessoais, de registros, depoimentos, cenas de apresentações, caseiras, de estúdio, mostrando uma história incrível e colocando Itamar no assunto de uma vez.


Música em quadrinhos
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uol


Com narrativa inspirada em histórias em quadrinhos, Arrigo Barnabé chegou 1979 com umas ideias bem doudas no I Festival Universitário da Música Brasileira: música de vanguarda colorida e tropical, progressista e debochada, caótica e ordenada, negativo da fotografia do groove, pós-Duprat e pós-Stockhausen, o estranhamento como casualidade. “Infortúnio” e “Diversões eletrônicas” (inspirada tortamente em Orestes Barbosa) – de “Já ganhou!” a “Fora!”.

Uma galera no palco para um acontecimento (não só) musical, incluindo Itamar Assumpção no baixo, Bocato no trombone, Paulinho Barnabé (irmão de Arrigo e depois fundador da Patife Band) na bateria, Klaus Petersen (do Premê) e Suzana Salles (hoje com Tom Zé) nas vozes, entre um monte de gente. “O que me influencia mais que música é quadrinhos”, diz Arrigo, citando Will Eisner, Robert Crumb, Homem-Aranha e Luiz Gê. Ou seja: uma coisa “plástica, com muito ritmo”.
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Aproveitamento máximo da sua atenção é uma raridade no rádio, daí o alta recomendação ao ótimo programa Supertônica, de Arrigo, no ar há anos, escondido na programação da Cultura Brasil. Sempre excelente de ouvir do começo ao fim, inteligente, com edição brilhante e silêncios valorizados, pelo arquivo dá pra encontrar conversas com Laerte, Tom Zé, Egberto Gismonti, Marlui Miranda, Céu, Bruno Morais, Leo Cavalcanti, Zé do Caixão.
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