Blog do Ronaldo Evangelista

Categoria : Abre aspas

se eu tenho tanto a perder eu perco é o medo
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Ronaldo Evangelista

O que se quer“, forrozinho simpático, parceria de Marisa Monte com Rodrigo Amarante, é belo momento do recém-lançado disco novo da cantora, com ele cantando junto e tocando quase tudo. Faixa-a-faixa de todo o álbum você lê por aqui, e logo acima no play o dueto, sobre o qual ela contou mais por aqui e trecho abaixo:

A música que eu me lembro de ter feito durante o processo foi consequência da minha passagem por Los Angeles, quando encontrei o Rodrigo Amarante. Eu nunca tinha feito nada com ele, mas existia uma vontade mútua. Um dia a gente se encontrou no estúdio porque a gente gravou uma música para o último Red Hot + Rio, “Nu com a minha música”, de Caetano Veloso e Devendra Banhart. Durante esse tempo em que a gente estava no estúdio, pintou a ideia de uma música. Ela já veio com algumas palavras, uma coisa que a gente fez junto na hora, já com alguns pedacinhos de letra. Depois, ele continuou sozinho. Quando ele veio ao Rio, ele trouxe o que ele tinha feito. Aí, demos aquela arredondada e eu achei que ela tinha a ver com o resto do disco todo. Ela fala sobre saber o que se quer e sobre pagar o preço do que se quer, mesmo parecendo loucura para todo mundo em volta. A música é na primeira pessoa e ela diz: “Vá, pode falar, pode escrever, eu vou me entregar”. É sobre o reconhecimento e a conquista do desejo.


Leo Cavalcanti indica cinco discos
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Ronaldo Evangelista

Falando nele, para o site Banda Desenhada Leo Cavalcanti escolheu alguns álbuns essenciais em sua formação: cítara indiana, violão espanhol, pop britânico, xote brasileiro, jazz americano, grande seleção, abaixo.


Ravi Shankar – The Sounds of India (1968)


Paco de Lucia – Almoraima (1976)


O Álbum Branco dos Beatles (1968)


Jackson do Pandeiro – Sua Majestade, O Rei do Ritmo (1959)


Chet Baker Sings (1956)


O documentário do disco novo de Siba
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Ronaldo Evangelista

Caio Jobim e Pablo Francischelli fizeram a série Pelas Tabelas, exibida pelo Canal Brasil, e são hoje os homens por trás da produtora DobleChapa.

Estão com um projeto saindo do forno: documentário sobre Siba e seu disco novo, produzido por Fernando Catatau, do Cidadão Instigado.

É a volta de Siba à guitarra, que não tocava desde os tempos de Mestre Ambrósio nos anos 90, e seu primeiro álbum solo depois dos discos pela última década com a Fuloresta – e desde sempre, na verdade.

Dá pra sentir um primeiro gostinho vendo essa versão de “Alados”, originalmente gravada no disco com a Fuloresta e aqui com o Cidadão Instigado, encontro de Siba e Catatau no piloto do Programa Compacto, do qual fiz a curadoria em 2010.

Foto acima, de Priscilla Buhr, Siba já na guitarra com a Fuloresta no carnaval de Nazaré da Mata em 2010, daqui.

Em entrevista ao site Banda Desenhada, Caio e Pablo contaram mais sobre o processo de feitura do disco de Siba e da documentação que fizeram. Por aqui ou trecho logo abaixo:

PF – Atualmente estamos com quatro projetos: O primeiro é um documentário, longa-metragem, com o Siba. Pode-se dizer que é um desdobramento do “Pelas Tabelas”. A nossa relação com ele se iniciou lá, quando participou da primeira temporada. E já nesse programa ele falava de uma vontade de fazer um trabalho diferente do que vinha fazendo com a Fuloresta [grupo formado por músicos tradicionais de Nazaré da Mata, PE]. Isso despertou nossa curiosidade e quando retomamos contato ano passado, ele nos falou do projeto que estava desenvolvendo: um disco voltado para a guitarra, com o Fernando Catatau produzindo. Nós conversamos e propomos documentar este trabalho. E foi o que efetivamente fizemos.

CJ – Documentamos todas as fases. No primeiro momento filmamos o Siba em Recife, para depois documentarmos todo o processo de gravação do disco, que só se encerrará quando o trabalho for levado para o palco. O filme se passa em vários lugares: São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Nazaré da Mata, Agreste pernambucano…

PF – E o projeto inicial que era documentar a gravação do disco tomou uma proporção maior, porque se trata de um álbum, como ele mesmo fala, de ruptura. É uma espécie de volta… O Siba começou tocando guitarra, integrou o Mestre Ambrósio, depois veio a Fuloresta e agora retoma a guitarra. Então, durante as filmagens, despontaram vários assuntos, incluindo aí o retrospecto de sua carreira e as indagações pertinentes ao rompimento com um gênero e com um modelo que o vinculava demasiadamente à música tradicional. Surgiram então os questionamentos do que é tradição e o que não é. E o Siba faz uma análise muito própria a respeito do seu trabalho, do seu fazer artístico. Ele é um músico peculiar, capaz de transitar pelo maracatu, pela ciranda e pelo rock com a mesma naturalidade.

CJ – E era vontade do Siba ter um documento audiovisual em que se aprofundassem todas essas questões estéticas que surgiram durante o processo de gravação do álbum. Durante muito tempo ele foi associado à música tradicional, sendo que o Mestre Ambrósio era uma das bandas mais importantes do mangue beat, ao lado do Chico Science & Nação Zumbi e o Mundo Livre S/A. Só que, por eles empunharem a rabeca e outros instrumentos ligados à música regional, acabaram sendo rotulados. Depois, esta questão se agravou ainda mais, quando ele se envolveu mais profundamente com a ciranda e o maracatu. Só que a grande busca do Siba enquanto artista não era ficar olhando para o passado, e sim pegar aquilo tudo e olhar para frente. Este álbum acabou se tornando então uma síntese de todas as suas experiências. O Siba não é um guitarrista, como ele mesmo diz, mas é através da guitarra que ele expressa a sua musicalidade.

Estamos agora no processo de montagem e devemos lançar em breve uma versão curta para Internet. A versão longa metragem ficará para o final de 2011. Estamos com a ideia de realizar uma distribuição diferente.


Bem Gil fala sobre Gilberto Gil 1968
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Ronaldo Evangelista

Também dentro do especial dia dos pais da série DNA Musical, artistas comentando discos importantes pra eles, no site do Oi Novo Som, Bem Gil – do Tono etc – comenta o segundo álbum solo de Gilberto Gil, o tropicalista, aquele com Duprat e Mutantes e capa do Rogério Duarte. Assim, logo abaixo.

O primeiro disco do Gil que me lembro de ter ouvido é o “O Eterno Deus Mu Dança”. Eu tinha 4 anos de idade quando esse disco foi lançado e, a partir de então, tenho memórias muito vivas de todos os trabalhos subsequentes.

Mas foi só aos 16 anos de idade que resolvi escutar toda discografia do meu pai em ordem de lançamento. Ouvi seu primeiro disco “Louvação” e resolvi, finalmente, pegar num violão pela primeira vez. E daí por diante, a cada disco que eu ouvia, uma nova paisagem se apresentava e minha vida mudava de novo e de novo.

Eleger um dele como o “disco que eu tocaria na íntegra” é difícil, mas a minha escolha, hoje, seria o segundo disco do Gil, de 1968, com a participação dos Mutantes.

É um disco que logo de cara me chamou a atenção pela espontaneidade. Gil resolveu (através de Rogério Duprat, seu arranjador) convidar os Mutantes para participar do disco e fez um álbum de “banda”. O que acabou se transformando em característica presente em vários de seus discos seguintes.

No sentido da “minha execução integral desse disco”, os Mutantes pesam muito pois são uma referência musical muito forte pra mim e pro Tono (banda com a qual exerço música desde a criação até a execução, em discos e shows).

Esse é o disco mais tropicalista do Gil, e um dos mais bonitos de todos os discos tropicalistas. As composições (poéticas) vão desde temas urbanos (“Domingou”), rurais (“Coragem pra Suportar”) e políticos (“Marginalia II”) até o resgate do folclore como em “Pega a Voga, Cabeludo”. Com a regravação de “Procissão” (presente no disco anterior), Gil didatiza o manifesto tropicalista, deixando os Mutantes a vontade para recompor a música sem qualquer tipo de limite estético/musical.

Apesar de tudo isso o que mais me chama a atenção pra esse disco é que “Luzia Luluza” é uma das gravações mais bonitas em todo repertório discográfico do Gil. É um conto tropicalista levado a Hollywood pela orquestração do Rogério Duprat. É lindo.”Pé da Roseira” é uma música que não me canso de ouvir.

E o disco fecha com “Domingo no Parque”. Música que dispensa qualquer tipo de apresentação/comentário e que foi apresentada pela primeira vez em público no festival de 67, ao lado dos Mutantes, e com regência do Rogério Duprat. Com certeza o pontapé inicial pra que este disco fosse lançado no ano seguinte.


Tita Lima fala sobre o Jardim Elétrico dos Mutantes
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Ronaldo Evangelista

Dentro de uma série chamada DNA Musical, no site do Oi Novo Som, artistas comentam discos que foram importantes para sua formação. Há algumas semanas, em especial do dia dos pais, Tita Lima comentou o quarto disco dos Mutantes, já com seu pai, Liminha, integrado à formação como baixista, logo abaixo.

Já que vocês pediram para escolher um disco dos Mutantes com o meu pai, não tenho dúvidas: Jardim Elétrico. Escolho o quarto disco da banda, de 1971, por uma questão afetiva. Quando eu era criança adorava o desenho da capa. Tinha medo e atração pelo monstro, tinha aquela imagem decorada e talvez até conseguisse redesenhar a arte com os olhos fechados. Eu ficava ouvindo “Portugal de Navio”, rindo da voz esquisita do meu pai.

Era tão pequena que não entendia o duplo sentido das letras. Para mim, escutar Saltimbancos e Mutantes era divertido. Vou trepar na escada significava: “Vou trepar na escada!”. Vou te mandar para Portugal de Navio era isso mesmo, eu imaginava meu pai mandando minha mãe viajar em navios antigos.

Eu achava que a Rita era uma fada madrinha/bruxa, mas das boas e que ela sempre iria me proteger quando eu ficasse no escuro. Pra mim, a Rita não era 100% humana, mas uma fada que transitava entre os humanos disfarçada e só eu sabia o segredo dela. Ela piscava pra mim quando me via e fazia carinho na minha orelha, eu achava que aquilo era um código. rsrsrsr!

As músicas mais valiosas para mim, além de “Portugal de Navio”, são “Lady Lady” porque eu acreditava que esta música havia sido feita para minha avó que se chamava Layde. Eu não sabia inglês! E “El Justiceiro” formava um personagem na minha cabeça, ele era lindo e forte, quase um herói, e era parecido com Walmor Chagas! rsrsrs.

Na verdade todas as músicas eram importantes para mim, faziam parte de um contexto, um filme. Não dava para pular uma faixa, eu não sabia mexer em vitrola e chegar perto de agulha era bronca na certa! Além de criar meus personagens para esse disco, eu o conhecia de cabo a rabo, sabia cada solo, cada voz …cada virada de bateria.


Donato, sem pressa
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Ronaldo Evangelista

Nesta quarta, 17 de agosto, João Donato completou 77 anos. Com seu zengroovismo e sensibilidade musical de dedos mágicos bailando pé ante pé pelas possibilidades de beleza sobre as harmonias e infinitas melodias, louco é todo mundo que não é Donato.

Apareça compondo, tocando ou participando de inúmeros discos levando incontáveis ideias, sons, brilhantismos e particularidades, simples de ouvir e instintivamente criativa, a música de Donato é um grande sim.

Como só os muito dotados de presença de espírito e naturalidade conseguem fazer acontecer, o tempo parece se curvar para ele encaixar tantas sugestões de toques de leveza na alma quanto desejar.

O ritmo é seu, harmonia é um processo desencadeado, paz é um lugar interno e música é saber se deixar levar. É legal saber pra onde se está indo e o prazer da viagem é a viagem.

§ No extra “As Aventuras de João”, do DVD Donatural, momentinhos, Donas comenta:

Pra passar prum mundo mais despreocupado com a vida. E menos apressado de chegar ali do outro lado da rua pra fazer não sei o quê. Pra ter ido logo e voltado logo e voltado pra casa logo pra assistir logo um programa logo e dormir logo e acordar logo pra sair de manhã logo e chegar não sei aonde logo.

E aí às vezes não tem tempo de tomar o cafezinho na hora do almoço porque, dá licença, não posso ficar pro cafezinho porque tenho que ir logo pra não sei aonde. E vai logo e você fica parado com dois cafezinhos. Aí você acaba não tomando nenhum dos dois, parece que você esqueceu de tomar até o seu café também.

Aí tudo isso faz você pensar que não tem pressa pra ir a lugar nenhum. Mesmo porque ninguém vai a lugar nenhum mesmo, vai todo mundo um dia morrer e se divertir com os momentinhos que foram passando lentamente pela pessoa. Senão ela não dá tempo nem de olhar para o lado. Se for muito depressa, você chega lá e não sabe mais onde está indo e não sabe mais por onde está passando. Nem foi, nem viu por onde ia.

Dizem que o prazer da viagem está na viagem, não em ter chegado lá. Quando chega lá, aí é festa total. Mas não é esperar pra chegar lá pra ser feliz. Você é feliz indo pra lá, desde ontem. O regulamento é assim: ser feliz ou ser feliz.

§ Acompanhando por 15 anos auge gravações de e com Donato, de trombone latino no Brasil e jazz em discos latinos a órgãos e pianos elétricos crazy e suaves, nos States e de volta, seleção em play contínuo logo abaixo, Donato 60-75:

João Donato e seu Conjunto – Mambinho (Dance Conosco, 1960)
Mongo Santamaria – Sabor (Mighty Mongo, 1962)
Tito Puente & His Orchestra – Sambaroco (Vaya Puente, 1962)
Donato e Seu Trio – Jodel (Muito à Vontade, 1962)
Donato e Seu Trio – Sambongo (A Bossa Muito Moderna de Donato e Seu Trio, 1963)
João Donato – It didn’t end (The New Sound of Brazil, 1965)
Bud Shank – Sausalito (Bud Shank and His Brazilian Friends, 1966)
Sergio Mendes & Brasil ’66 – The Frog (Look Around, 1968)
Cal Tjader – Warm song (The Prophet, 1968)
Cal Tjader – Amazon (Solar Heat, 1968)
João Donato – Cadê Jodel? (A Bad Donato, 1970)
João Donato e Eumir Deodato – Batuque (Donato/Deodato, 1972)
João Donato – Me deixa (Quem é Quem, 1973)
Nana Caymmi – Ahiê (Nana Caymmi, 1973)
Gal Costa – Até quem sabe (Cantar, 1974)
João Donato – Deixei recado (Lugar Comum, 1975)

§ A linda e íntima foto, de Jorge Bispo, 2008, veio daqui.


Sou só música
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Ronaldo Evangelista

O trabalho de Miles Davis com o arranjador Gil Evans é sublime. Os momentos de beleza máxima atingidos realmente não passam impunes pelos corações mais sensíveis. Rodrigo Carneiro, em seu blog, reportou a bela história que ele viu n’O Som do Vinil, de quando Airto e Flora se conheceram e se juntaram:

Há algumas semanas, a cantora Flora Purim, uma das maiores do mundo, contou o início de sua longeva história de amor com o primoroso percussionista Airto Moreira no programa O Som do Vinil, exibido pelo Canal Brasil – Butterfly Dreams (1973), álbum gravado por ela nos EUA era o tema do semanal. Filha de pai violinista e mãe pianista, desde muito nova, Flora sempre soube tudo de música erudita e jazz. Ávida colecionadora de discos, certo dia ela chamou Moreira, com quem estava tocando em uma boate carioca, para uma audição de Miles Ahead, disco que Miles Davis havia lançado em 1957.

Por alguma razão inexplicável, Moreira sempre lhe fora distante. Nos ensaios, conversava o estritamente necessário. E só aceitou o convite por se tratar da audição de um álbum de Miles que ele desconhecia. Algo que Flora insistia que ele fizesse. “O disco tem tudo a ver com você”, argumentava. Talvez intuísse que anos mais tarde, lá estaria Moreira na banda e na ficha técnica de Bitches Brew (1970), outro momento luminoso de um dos artistas mais importantes do século 20. Pois foram os dois para a casa da cantora. Miles Ahead foi colocado na vitrola.

Aos primeiros acordes de “My Ship”, de Kurt Weill, Moreira baixou a guarda. Caiu em prantos, extremamente tocado pela interpretação de Miles. Flora então perguntou se estava tudo bem. E aproveitou para brincar com o músico que se debulhava em lágrimas: “Homem não chora, Airto”. Ao que o percussionista prontamente respondeu: “Pode até não chorar, mas agora eu já não sou nem mais homem. Sou só música, e estou completamente apaixonado por você”.


Tom Zé em Nova York
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Ronaldo Evangelista

*Eduardo Graça, em coluna n’O Globo, escreveu sobre o show de Tom Zé em Nova York há duas semanas:

Logo no começo de seu arrebatador e caótico show no Festival do Lincoln Center, o evento mais nobre da programação cultural de Nova York, Tom Zé conta que recebeu de uma banda do interior dos EUA uma gravação com uma versão de uma música dos Mutantes. Emocionado, ele fala da alegria de ter composto com Rita Lee a moda de viola “Astronauta libertado”, gravada com o título “2001” por Gilberto Gil em 1969. Parceiro do futuro, ele pede que a plateia cante com ele trechos da composição. Em vão.

É que o mais sertanejo dos tropicalistas, em delicioso paradoxo, é também o mais internacional dos medalhões de nossa música popular. A audiência, nesta terça-feira, era formada majoritariamente por fãs americanos, ansiosos por ouvir e ver “Tom Zee”, incapazes de cantar verdades nunca tão obviamente escancaradas como “Nos braços de dois mil anos/Eu nasci sem ter idade/Sou casado, sou solteiro/Sou baiano e estrangeiro”.

O show estava marcado para as 20h, mas o espetáculo começou mais cedo, nas escadarias do lado de fora do Alice Tully Hall. Os 1,1 mil ingressos postos à venda estavam esgotados e a fila de desistência impressionava tanto pelo tamanho quanto pela animação. Os muy simpáticos nova-iorquinos sem entrada, carentes de português, eram rápidos na agulha, feições de especialistas, ao tratarem, seriíssimos, da importância de “Estudando o Samba”, o disco de Mr.Zee de 1976 que tanto impressionou David Byrne.

*A foto é do New York Times, que também publicou crítica de Ben Ratliff sobre o show. Pode-se dizer que não foi tão elogiosa, mas os pontos de Ratliff talvez não sejam exatamente aspectos que Tom Zé consideraria negativos, desconstrutor do pop que é:

His work gets a bit meta. He has sweet songs, but at other times he seems to interrogate rhythm and tonality and song structure, making the listener uncomfortable. He tends toward fractures, disruptions and dissonance. (He walked onstage twice at the beginning of the show, repeating the act because of insufficient applause; one of the songs in his set, “Jingle do Disco,” was a kind of pop-art commercial for himself.)

At the same time, Tom Zé is a positive presence: he really wants to please, to connect. But his disruptive tendencies might have gotten the best of him. (…) Tom Zé is alive to paradox and perversity; he celebrates it, shoving inapposite ideas together, appreciating the dirtiness of life. That is his genius. But this concert lost control of its argument.

Tags : Tom Zé


Itamar Assumpção, mais ou menos organizado
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Ronaldo Evangelista

Eu seu novo blog de escritos sobre cinema, Kiko Dinucci comenta Daquele Instante em Diante, o documentário de Itamar:

Não é à toa que o filme começa em tom investigativo. Seus personagens vasculham os mais remotos arquivos pessoais para o público tentar desvendar o que foi a passagem desse artista pelo século XX, dono de uma obra intensa e original, a frente de seu tempo (ainda) e que desafiou as estruturas da indústria fonográfica e da própria linguagem da música popular brasileira.

Suzana Salles, Alice Ruiz, Luiz Waack e Alzira Espíndola aparecem no início do documentário procurando arquivos sonoros, manuscritos, matérias de jornais. A investigação será a principal ferramenta de Velloso para conduzir o filme, do começo ao fim, ele mostrará arquivos de áudio, vídeo, fotos, shows, entrevistas, reproduzindo de certa maneira a investigação dos personagens iniciais. Suzana Salles mostra o seu fichário e avisa: estão mais ou menos organizados. Parece ser a ordem de como Velloso irá expor os seus arquivos. Para Itamar, “totalmente organizado” seria uma prisão. O “mais ou menos organizado” abre o leque para a surpresa, o inesperado, e é isso o que acontece.

Embora o filme tenha uma narrativa linear, não se rende ao convencional. O diretor opta por uma narrativa polifônica, assim como os arranjos e composições de Itamar. Vozes sobrepostas, sons de cenas futuras ou anteriores invadindo o começo e o fim das cenas e um incrível diálogo das canções de Itamar com os temas sugeridos pelos depoimentos. Fica evidente nesse caso a observação de Luiz Tatit, que diz que Itamar vem de uma leva de artistas que não distinguem a sua obra da vida real. Eis o que faz as canções entrarem no filme como uma linha de costura entre as cenas.

Tem mais, segue por aqui.