Blog do Ronaldo Evangelista

Arquivo : Gal Costa

Rabotnik
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Ronaldo Evangelista

Falando no novo da Gal, um nome que participa do álbum é o quarteto experimental Rabotnik, fazendo toda a base instrumental de algumas faixas. Com Estevão Casé, Eduardo Manso, Bruno Dilullo e Rafael Rocha (os dois últimos também do Tono), tocam pela noite do Rio há um tempo, no ano passado chegaram a fazer temporada no Pista 3 com participações como Kassin, Rob Mazurek e Marcelo Camelo. Já lançaram um álbum pela gravadora inglesa Far Out e agora estão levantando verba via crowdfunding (pelo mesmo projeto Embolacha de que participam Letuce e Autoramas) para prensar um CD, gravado em 2009 com participação do Damo Suzuki, do Can. Pela rede, mil sons do Rabotnik para ouvir, como no pequeno compêndio abaixo.



“Dínamo” e “Em dependência”, gravadas em 2009.



Ao vivo em janeiro de 2011.


Ao vivo com Kassin e Rob Mazurek em 2010.


Ao vivo com Marcelo Camelo em 2010.


Gal Costa + Caetano Veloso
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Ronaldo Evangelista

Você já foi à Bahia, nêga? Há algumas semanas, fui pela primeira vez. Business e pleasure: a razão foi encontrar Caetano e Gal em Salvador, matéria de capa para a Rolling Stone. Domingo, a estreia em dupla de 67, talvez tenha sido o primeiro disco pelo qual sinceramente me apaixonei tanto de um como de outro, e foi uma delícia mergulhar na história dessa relação para chegar no disco novo de Gal, todo composto por Caetano e produzido por ele e por Moreno Veloso, com jovens músicos cariocas. Doce é o título que foi soprado – mais ainda falta um mês ou dois para o lançamento, e até lá sabe como é. Reunindo memórias e projetando o futuro, a história do encontro desses dois baianos – e meu com os dois baianos – você começa a ler logo abaixo.

Sentados lado a lado, cada um em uma ponta de um sofá bege de listras marrons no camarim de um estúdio fotográfico em Salvador, Caetano Veloso, 68, e Gal Costa, 65, tem 50 anos de história para lembrar. Caetano senta-se reto, atento; Gal está à vontade, com as costas fundas no sofá. Passeando entre os muitos pontos de intersecção em duas carreiras sempre próximas e distantes, falam dirigindo-se tão frequentemente um ao outro quanto a mim, sentado em uma cadeira de frente para os dois. Enquanto reconstroem memórias em par, completam as frases mútuas com intimidade além daquela de namorados ou irmãos, mas de amizades que se orbitam, não importa quantas vezes o planeta gire. Se amizade é identificação, confiança, comunhão de raízes, empatia ilimitada, amigos são mais do que a família que escolhemos, são aqueles que continuam nos conhecendo quando mudamos.

Alguém entra na sala, traz água de coco para Gal e sai. Caetano cruza as pernas embaixo de si, no sofá. Estamos aqui por uma ocasião especial: Caetano, vindo de uma fase especialmente carregada de frescor, depois dos discos e Zii e Zie (e um ao vivo com Maria Gadú, vá lá), se viu tomado por inspiração para desencadear um processo semelhante com Gal, compondo todo um disco para ela e direcionando as gravações (se nada mudar, o álbum, previsto para setembro, deverá se chamar Doce). A última vez que ela entrou em estúdio para fazer um álbum foi em 2005 – Hoje, lançado pela gravadora Trama. O novo disco terá o apoio da gravadora Universal, que também lança os discos de Caetano e recentemente compilou os LPs de Gal gravados entre 1967 e 1983 em uma caixa com 16 CDs.

Gal e Caetano estão apreensivos, em pleno processo de finalização do álbum: faltam poucos dias para terminarem de registrar as vozes definitivas no estúdio de Carlinhos Brown, no Candeal. As bases já foram gravadas no Rio com a ajuda de Moreno Veloso – filho de Caetano e afilhado de Gal – e com participações de jovens músicos cariocas. Assim que o último rec virar stop, os arquivos de áudio ganharão mixagem, masterização, título e capa. Hoje, sábado nublado de junho, estamos na Bahia para falar do passado no presente – Bahia que já existia em mim através das músicas e agora se materializa no momento vivido e no cenário de lembranças do compositor e da cantora.

“O Caetano para mim é muito importante por tudo que a gente viveu e conviveu”, Gal começa. “Por tudo que ele compôs, tantas músicas que ele fez para mim, direcionadas a mim, falando para mim. Eu adoro as canções de Caetano. Ele é o compositor que melhor escreve para mim, para a minha voz, para mim mesmo. A gente tem uma identificação musical. Neste momento, Caetano fazer este trabalho comigo é maravilhoso. É muito importante historicamente e emocionalmente.”

Caetano, propulsor da ideia há um ano e meio, quando pela primeira vez contou a Gal do novo projeto, explica que a vontade deste álbum nasceu de pensar na história da presença de ambos na música e na história da própria música brasileira. “Gal tem uma qualidade de emissão vocal muito especial e um papel histórico muito importante, e as duas coisas estavam relativamente subvalorizadas nos últimos tempos”, reflete. “Tenho necessidade de ter uma visão histórica mais equilibrada, e isso me pareceu como uma necessidade para mim mesmo e tenho certeza que para os outros também. Então fiquei com desejo de fazer o repertório e produzir um disco todo para Gal. Me interesso muito por fazer este disco agora, para reequilibrar a visão histórica.”

Gal, entretanto, deixa claro que em nenhum momento a ideia foi homenagear o que houve, mas sim o que ainda há para haver. “Não vai ter nada a ver com nenhum disco que eu já fiz na vida, nem com nenhum disco que ele já fez na vida”, explica. “Vai ser uma coisa nova, repertório novo, tudo novo, mas é claro que tem a ver com passado porque a nossa história está impregnada na gente.”
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O resto você lê na Rolling Stone deste mês, nas bancas.
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uma forma antropofágica de relação com a cultura
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Ronaldo Evangelista

Em agosto de 1968, Caetano e Gil integravam um espetáculo da empresa têxtil Rhodia e planejavam como injetar mais Tropicália no zeitgeist da música brasileira. Um dos grandes projetos era o especial de TV Vida Paixão e Banana do Tropicalismo, escrito por Torquato Neto e José Carlos Capinan para a Rede Globo, com grandioso elenco e anarquias a granel.

Nunca foi o planejado (a Rhodia quis mexer, depois não quis patrocinar, depois a Globo adiou várias vezes a exibição), mas na noite de 23 de agosto de 1968, foi registrado o piloto, na gafieira Som de Cristal, na rua Rêgo Freitas, centro de São Paulo. Detalhe muito simbólico é que Vicente Celestino, que passou a tarde no estúdio ensaiando para sua participação, morreu à noite, logo antes de começarem a gravação – primeira vítima fatal da Tropicália.

O que finalmente foi ao ar, no dia 27 de setembro, levou o nome de Direito de Nascer e Morrer do Tropicalismo, hoje só na memória de quem assistiu ou estava presente. Pra posteridade, logo abaixo, as 14 páginas do roteiro original de Torquato e Capinan, com aparições de Chacrinha, Aracy de Almeida, Linda e Dircinha Batista, Nara Leão, Tom Zé, Gal Costa, Grande Otelo, Os Mutantes, Rogério Duprat, Jorge Ben e Dalva de Oliveira – todos presentes na gravação em carne e osso.








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Roteiro via.
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João pela primeira vez
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Ronaldo Evangelista

Incrível como todo mundo da geração 60 se lembra exatamente de quando ouviu João Gilberto pela primeira vez. Não só eles: de antes e até hoje, o som de João é algo único, impactante de tão claro e definido em si mesmo. Desde a época em que era o último lançamento e você podia ouvir sua música no rádio ou nos ainda novos LPs de vinil e vitrolas até hoje, em que abundam relançamentos piratas (digamos, “extraoficiais”) em CD e vinil e mp3s de discos e shows pela rede, João continua soando moderno e atemporal. Você se lembra de quando ouviu a música de João Gilberto pela primeira vez? Caetano, Gal e Gil lembram.

Gilberto Gil, em depoimento a Zuza Homem de Mello, 1968: Em 1959 eu estava na Bahia e um dia ouvindo rádio, ouvi um disco do João Gilberto: fiquei assustado quando ouvi aquilo, parece que era “Morena Boca-de-Ouro”, ouvi aquilo cantado de uma maneira estranha, com um acompanhamento estranho e fiquei realmente chocado. Me lembro que era um dia em que eu voltava da aula, eram duas horas da tarde, tinha acabado de almoçar e tinha ligado a Rádio Bahia. Não sabia de nada que estava acontecendo no Rio e de repente ouvi aquela coisa. Fiquei sabendo que era o João Gilberto porque telefonei para a rádio perguntando o que era aquilo, quem estava cantando aquele troço, disseram que era o João, eu fui à loja de discos procurar, ainda não tinha chegado, mas quando chegou eu comprei, foi aquela paixão absoluta, momentânea e total pela coisa, foi uma paixão que me tomou durante todos aqueles anos subsequentes.

Caetano Veloso em “Verdade Tropical”, 1997: Eu tinha dezessete anos quando ouvi pela primeira vez João Gilberto. Ainda morava em Santo Amaro, e foi um colega do ginásio quem me mostrou a novidade que lhe parecera estranha e que, por isso mesmo, ele julgara que me interessaria: “Caetano, você que gosta de coisas loucas, você precisa ouvir o disco desse sujeito que canta totalmente desafinado, a orquestra vai pra um lado e ele vai pro outro”. Ele exagerava a estranheza que a audição de João lhe causava, possivelmente encorajado pelo título da canção “Desafinado” – uma pista falsa para primeiros ouvintes de uma composição que, com seus intervalos melódicos inusitados, exigia intérpretes afinadíssimos e terminava, na delicada ironia de suas palavras, pedindo tolerância para aqueles que não o eram. A bossa nova nos arrebatou. Em Santo Amaro nós cultuávamos João Gilberto em frente a um boteco modesto que chamávamos “bar de Bubu”, por causa do nome do preto gordo que era seu dono. Ele comprar o primeiro LP de João, Chega de Saudade – o disco inaugutal do movimento -, e tocava-o repetidas vezes. Primeiro, por ele próprio gostava , e, depois, porque saia que nós íamos ali para ouvi-lo.

Gal Costa em entrevista a Ronaldo Evangelista, 2010: Eu era uma menina e ouvia tudo que se tocava nas rádios. Eu ouvia Angela Maria, Dalva de Oliveira, ouvia Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro. Eu gostava das coisas legais, via todo mundo – Sarah, Ella, Betty Carter, Chet Baker, Frank Sinatra, Ray Charles, Louis Armstrong. Mas o dia em que ouvi João Gilberto cantando “Chega de saudade” foi um impacto profundo e uma atração imediata. Era uma coisa totalmente estranha e nova naquela época, mas eu abracei aquilo com paixão. Mudou a minha vida, ali eu reaprendi a cantar. Sou autodidata, sempre soube tudo de canto sem nunca ter ido escola. Respiração, diafragma, técnica vocal, divisão rítmica da poesia, da palavra cantada, respiração. Ouvia João muito atentamente, com muita paixão. E comecei a estudar emissão vocal em casa. No banheiro, com panela, com meu eco, reverberação, comecei a estudar, prestava atenção a tudo. João Gilberto é minha grande referência.
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§As lembranças completas, mais Chico Buarque e Roberto Carlos, em matéria do UOL Música, por aqui.
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