Blog do Ronaldo Evangelista

Arquivo : julho 2011

Eu vou ter um atrito com o senhor!
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Ronaldo Evangelista

Cidadão, antes de fazer qualquer coisa, eu quero solicitar uma coisa: o senhor não me alterque, viu? Se esse porquinho do maranhão altercar com Bim Bim, vai ofender a família em geral e a mulher brasileira em particular, gente do céu e de lugar não longe disso, mas mais santo: Maranguape. O maravilhoso trecho no play acima – lenço ou touca? – é do LP Chico Anisio Show, lançado pela Philips em 1962, ano em que nosso herói já era um gênio dos personagens e situações, tiradas e sacadas, frases de efeito e contemplações de duplo sentido, e fez apresentação na casa carioca Au Bon Gourmet, com participação do Tamba Trio – que canta a música-tema de abertura do álbum. Agora vejamos um som que um homem possa ouvir. Alguma coisa a contestar?


Protejam seus filhos porque o super-homem vem aí
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Ronaldo Evangelista

O sertanejo é antes de tudo um forte. Em homenagem aos milhões de Severinos, vamos falar de cultura: grande filmador e grande personagem, Glauber Rocha tira as máscaras do cinema brasileiro no programa Abertura da TV Tupi, fim dos anos 70. Quanto custa uma sequência pra filmar super-homem? Além: Emanuelle e Último Tango em Paris não são obra de arte, são apenas filmes pornográficos!

Via.


Faixa a faixa: Lost Sessions do Marcos Valle, 1966
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Ronaldo Evangelista

Já chegou à mão dos mais inteirados a caixa Tudo, com a discografia de Marcos Valle na gravadora Odeon (hoje EMI) entre 1963 e 1974. Como sabido, um CD bônus traz um disco até hoje inédito, gravado em 1966 e apenas parcialmente com a voz de Valle, na prática pérola instrumental sessentista. Ouvindo o disco com sede dos arranjos de Eumir Deodato – que fez também os discos imediatamente anteriores e posteriores de Valle -, acompanho com anotações faixa a faixa, logo abaixo.

Os Grilos
Como quase todas as faixas do “álbum” na base dos dois minutos, é só o necessário pra um clássico: prenúncio de trompetes, groove de baixo, violão e cordas entrando perfeitos, a melodia irresistível cantada por Valle. O balanço de piano do final e o trompete com surdina que acompanha o canto ficam ainda mais brilhantes ao ouvido na versão instrumental de bônus no fim do CD. Foi lançada, ao lado de três outras faixas deste disco, em um compacto na época.

Uma lágrima
Depois do começo com cordas e metais, entra o violão de balanço bossa nova onde certamente estaria a voz. Parece pouco, mas o groove de baixo e bateria que entra quase ao um minuto é perfeito, com uma bela cama de cordas e acordes tranquilos de sopros. A única totalmente inédita do disco é a que mais soa como curiosidade, janela para o processo de criação, espaços vazios onde estaria a melodia desconhecida.

Lá eu não vou
Grande balanço de violão, baixo e bateria, levado por ataque de sopros e cordas. O que potencialmente seria uma das mais marcantes do LP que não houve virou nota de rodapé de Marcos Valle, aqui um lado B discreto samba-jazz, esquecida pelo autor enquanto regravada no terceiro LP de Claudete Soares, em 67.

Batucada surgiu
Música muito conhecida de Marcos Valle, mas nem tanto nessa versão original, lançada só no compacto mencionado e agora como parte da sequência original do álbum não lançado. A sugestividade dos sopros, o suingue de violão e detalhes de piano, o balanço da melodia: um clássico regravado em várias versões, muitas instrumentais. Dá pra entender ouvindo a perfeição do arranjo instrumental envolvendo a voz, e também perfeito na versão sem voz – faixa-bônus do CD bônus. Fazer samba é não morrer.

Primeira solidão
Outra que soa como curiosidade, sem a voz de Valle para acompanhar a base de violão bossa nova e o arranjo sem muitos elementos extras além das caídas orquestrais, cordas e flautas e trompetes distantes, bossa lenta. Gravada, como canção, afinal, no mesmo 1966 pel’Os Cariocas, no álbum Arte/Vozes.

O amor é chama
Piano moderno e violino belo e simples, baixo e bateria jazzísticos, bossa tão elegante que mesmo já assim sem voz foi lançada no compacto com “Grilos” – violão e piano tinindo e um curtíssimo e lindo solo do que soa como uma aveludade trompa ou um flugelhorn.

É preciso cantar
É ouvir os sopros samba-jazz da introdução se encaixando perfeitos com a melodia que Valle logo entra cantando pra perceber que não dá pra subestimar os elementos que ouvimos dentro de arranjos tão ricos – como são exatos os breves comentários instrumentais por todas as composições. E não esquece: é um defeito ser sentimental.

Pensa
Levado por dedilhado de guitarra e clima pianinho, pouco depois do um minuto a dinâmica levanta para receber um solo de sax, que leva a faixa até o final. Teria ficado lindo Valle cantando solo no começo e talvez duetando com o sax na segunda parte. Dá pra imaginar ouvindo a versão lançada da canção um ano antes pela cantora Luiza, com arranjo de Moacir Santos.

Mais vale uma canção
Sem a melodia principal, os acordes de sopros nos contracantos e curtos solos de piano ganham ares de protagonista e a levada pra frente de bateria e violão transformam a faixa instrumental em um hit perdido do samba-jazz, talvez até melhor assim sem voz. Pra checar, no mesmo ano Os Cariocas gravaram também essa canção no LP Passaporte.

Lenda
Linha grandiosa de cordas e sopros suaves anunciam o que certamente seria uma dessas canções de Marcos que se desenvolvem tranquilamente, com melodia perfeita e letra de ecoar na cabeça. Sem dúvida: só ouvir, em 1971 Cassiano gravou a canção lindamente no álbum Imagem e Soul. Aqui ainda sem voz, com breves interjeições de sax e um riff de cordas e trompete com surdina pontuando o refrão.

Se você soubesse
Riff de cordas e ritmo à broadway, com ataque de sopros samba-jazz. O violão, sem a voz por cima, leva um balanço tão bom que não decepciona quando ganha o primeiro plano. Os breves comentários de trompete e sopros e cordas e viradas de bateria garantem o resto da dinâmica.


Bahia Fantástica
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Ronaldo Evangelista

Mais um belo disco vem se anunciando nessa temporada 2011: Bahia Fantástica, de Rodrigo Campos.

De São Mateus pro Recôncavo, partindo da periferia de São Paulo para chegar em um lugar não-geográfico, vislumbrando a paisagem desenhada com nomes e cenas. Partindo do samba para chegar a um som universal, falando em Curtis Mayfield e Funkadelic.

Vocal sussurrado, groove de alta classe de violão e uma banda explosiva, na ponta de criatividade em São Paulo: Kiko Dinucci na guitarra, Marcelo Cabral no baixo, Mauricio Fleury no teclado, Mauricio Takara na bateria, Thiago França no sax tenor e flauta. Romulo Fróes assina a direção musical, Luisa Maita participa, Gustavo Lenza grava.

Além das ideias boas no teaser de quinze minutos acima, play valioso pelos trechos de ensaio e gravação, alta qualidade de som nascendo.


Conexão Nave-Mãe
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Ronaldo Evangelista

Muito estranho terminar a sexta vendo George Clinton no auge aos 70 e começar o sábado sabendo da Amy partindo aos 27, alegria total à profunda tristeza fatalista. Seja como for, alheios aos caminhos que Amy trilhava, nós e Clinton abusávamos da madrugada, comemorando o aniversário do capitão da nave-mãe em grande estilo, libertando o quadril e expandindo a mente. Abaixo, a crítica que escrevi direto do front, publicada na Folha.

Talvez se você já conhecesse algum dos discos de suas clássicas bandas Parliament ou Funkadelic ou tivesse lido sua autodescrição como “guarda de trânsito” no palco entre mais de 20 músicos, poderia se considerar preparado para um show de George Clinton em toda sua apoteose.

Mas a nave-mãe pousou com estilo extra na madrugada da última sexta-feira, apresentação do mestre funk dentro de festival “black” – de saída especial por ser a comemoração em pleno palco do aniversário de 70 anos de Clinton.

Recepcionado pelos rappers Flavor Flav e Chuck D, da banda Public Enemy, que apareceram de surpresa para participação logo no início do show, George Clinton entrou no palco de quepe de piloto, orquestrando a balbúrdia dançante no meio de um guitarrista mascarado e uma vocalista patinadora, entre outros personagens.

Quando apareceu um bolo no palco para acompanhar os parabéns que todos cantavam, Clinton sem hesitar arrancou um pedaço com a mão, serviu-se e ainda lambuzou os rostos de seu guitarrista e Flavor Flav.

Apesar das extravagâncias, a banda seguia absolutamente perfeita em cada nota, acorde, solo, dinâmicas em hits como “Give up the funk”, “Free your mind and your ass will follow”, “Flash light”, “Knee deep” e “Mothership connection”. Aula de música dançante, lição de diversão e libertação. Não à toa, na plateia o icônico dançarino Nelson Triunfo exibia um dos maiores penteados afro já vistos no Brasil.

Em “Somethin’ stank” (de letra que diz algo como “senti o cheiro e quero um pouco”), Clinton convocou ao palco a neta rapper, Sativa Clinton, e fez sinais encorajando ao público que fumasse. Pediu e foi atendido: um presente encostou no palco e lhe ofereceu um cigarro enrolado à mão (presumivelmente um baseado), que Clinton acendeu ali mesmo, na hora.

Entre música máxima, performances algo surrealistas e o irresistível chamado à diversão em tempo integral de Clinton, não foi muito diferente do que se esperaria de uma viagem psicodélica a outra dimensão. No caso, ao universo colorido e particular de George Clinton.


Falando sobre Chico Buarque no Metrópolis
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Ronaldo Evangelista

Sexta passada fiz uma aparição ao vivo no programa Metrópolis, convidado a dar meus dois centavos de opinião sobre Chico, disco novo do Buarque. Eu e Cadão conversamos sobre vontade de novidade, novas rimas para o mundo, colocação de vida pessoal na arte, o antagonismo milenar de Chico e Caetano e comentamos os comentários de Marcus Preto, que disse algo do efeito de “Chico Buarque fazer disco ruim é bom para a nova geração, que faz discos ótimos”. Mas, ao invés de falarmos de Tulipa, proponho essa: Chico não carrega algumas coincidências com Toque Dela, recente álbum de Marcelo Camelo? Essa e outras ideias, oito minutos de papo, play acima.


pop-eye
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Ronaldo Evangelista

Pra não dizer que não existem notícias quentes, apanhado da temporada de manchetes, notícias, declarações, especulações, próximas, radar.

§ Depois do papo de Doce, novo sopro de nome do disco novo de Gal com Caetano: Segunda.

§ Falando na Gal, MauVal e Matias foram dois que não curtiram a capa da última Rolling Stone.

§ Falando no Caetano, ele vai cantar “Não existe amor em SP” no VMB com Criolo & Ganja.

§ Enquanto isso, David Byrne também curtiu o disco da Tulipa.

§ Marcus Preto foi ouvir umas novas do disco da Mallu.

§ O disco do Emicida gravado em NY sai logo mais.

§ Céu, em entrevista em turnê em Londres, disse que deve lançar algo novo no ano que vem.

§ Vazou o Tim Maia Racional 3 (lógico).

§ Teresa Cristina planeja disco novo só com canções de Candeia.

§ Vídeo da Dona Inah cantando no último disco de Romulo Fróes.

§ “Kamasutra“, parceria com Arnaldo Antunes, primeira música de Sexo, disco novo do Erasmo Carlos, 70 anos.

§ Nos próximos meses, o Studio SP abre filial no Rio de Janeiro e reabre seu espaço na Vila Madalena.

§ Eliana, grávida de João Marcelo Bôscoli: “Carrego um pedacinho da Elis”.


Feliz aniversário, George Clinton
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Ronaldo Evangelista

George Clinton, mestre-guia da diversão interestelar, comemora 70 anos hoje, no palco do festival Black na Cena, que tem ainda Jorge Benjor, Lee Perry com Mad Professor, Racionais MCs, Public Enemy, Seu Jorge. Conversei com o capitão da nave, aproveitei para dar parabéns e perguntar para sobre a confusão ordenada de seus shows, o DNA do rap, o ímpeto da diversão e nunca parar. Ontem saiu em matéria na Folha, quase como abaixo.

Liberte sua mente que seu traseiro vai junto. A máxima de George Clinton, título de um álbum do Funkadelic de 1970, parece ser mote de festivais em 2011, convocação à dança aos sons da música negra, de funk antigo e moderno ao hip-hop e até samba-rock.

Além dos recentes shows no Brasil de Amy Winehouse e Sharon Stone e dos anúncios de apresentações de Prince e Macy Gray (no Rio de Janeiro em agosto, no festival Back2Black) e Stevie Wonder, Jamiroquai, Joss Stone e Janelle Monáe (em setembro no Rock in Rio), acontece de sexta a domingo em São Paulo o megafestival Black na Cena, na Arena Anhembi.

Atração principal da primeira noite, o visionário genial e excêntrico George Clinton comemora o aniversário de 70 anos em pleno palco, se apresentando ao lado de banda de mais de 20 integrantes – incluindo três bateristas, cinco guitarristas, dois tecladistas e dez vocalistas.

“Meu papel é ser o guarda de trânsito da música em cima do palco”, contou ele ao telefone, com voz rouca e grave. “Eu crio, mas também desordeno tudo. Gosto de dar obstáculos aos músicos, pra não ficar fácil demais, deixar sempre desafiador. Eles não podem parar, tem que dar o melhor que podem para o que a música precisa e tocam assim constantemente – através de todos os obstáculos e também quando estão confortáveis. Eles sentem o que o público precisa pra dançar.”

Quarenta anos de hits devem ser bem representados no show, com músicas como “Atomic dog” (de Clinton solo, 1982) e “Give up the funk” (do Parliament, de 1976). Referência máxima para tanto de hoje em dia, difícil sequer imaginar o cenário pop sem a influência de Clinton e suas famosas criações da mitologia P-Funk, das bandas Funkadelic e Parliament. Uma nação sob o mesmo groove.

“Meus antigos discos fazem muito sentido hoje porque foi dali que veio muito do hip-hop”, enxerga o compositor, cantor, mestre de cerimônias, guarda de trânsito. “No álbum “Mothership Connection”, eu estava interpretando o papel dos meus DJs favoritos de Nova York, era basicamente como um DJ falando em cima das músicas. Foi isso que o hip-hop virou: música para pista de dança, com DJs falando por cima dos discos. Era o que estávamos fazendo.”

E, desde sempre, com o espírito de convocação em primeiro plano, tantas músicas nestes 40 anos falando sobre vencer, conquistar, dançar, realizar. A inspiração para tanta pró-atividade? “Diversão, festas e fazer o que tem que ser feito”, explica o mestre. “Fazer ao máximo, nunca parar de fazer, sempre evoluindo e sempre se movendo. Toda a intenção da minha vida e da minha música é provocar as pessoas a se divertirem.”


A nova capa do disco Edu & Bethânia
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Ronaldo Evangelista

Que viagem: a nova reedição em CD do disco de Edu Lobo & Maria Bethânia de 1967, teve a capa (de Cesar Villela) alterada, acima, agora sem a foto original. Pedro Moraes (filho de Vinicius), autor da foto, decidiu não liberar o uso de sua imagem na nova edição. (Leia-se quis ganhar mais do que a Universal estava disposta a pagar – leia-se provavelmente nada.) O CD com a nova capa está saindo dentro do box Maria (sai junto com outro chamado Bethânia), e no ano passado o mesmo aconteceu no box lançado pela mesma gravadora de Gal Costa, só que ali foi no disco Gal & Caymmi.


Caetano e Gil na Ilha de Wight, 1970
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Ronaldo Evangelista

Quando partiram do Brasil em julho de 1969, primeiro para Portugal, depois para a França, Caetano Veloso e Gilberto Gil já davam o tropicalismo como morto. Foi angustiante, mas de certa maneira também libertador: focaram ainda mais na beleza das canções e força dos happenings, passaram a compor em inglês e ampliaram a visão cosmopolita. Quando afinal se decidiram por Londres – e lá moraram pelos dois anos seguintes -, tiveram acesso direto ao pop global da época, em mais de um sentido.

Ainda em 1969 foram à segunda edição do Festival da Ilha de Wight e viram Bob Dylan ao vivo. No ano seguinte, em 1970, foram lá assistir Jimi Hendrix e Miles Davis. O show de Miles, com uma única música, chamada “Call it anything”, trazia Airto Moreira na percussão e na versão lançada em DVD dá até pra ver o Gil na plateia assistindo.

De repente, logo depois do show do Miles, ouviu-se ao microfone: “Brazilian composers Gilberto Gil and Caetano Veloso, invited to the backstage by Miles Davis!” Eles atravessaram as 600 mil pessoas e chegaram ao camarim, onde encontraram o responsável pelo chamado, Airto, e conheceram Miles.

No terceiro dia do festival, viraram atração e subiram ao palco com mais de uma dezena de brasileiros (Gal e os músicos d’A Bolha também estavam no festival com eles) para cantar algumas das novas canções em inglês e protagonizar um happening que envolvia uma roupa coletiva de plástico vermelho (criação de uma artista plástica francesa) e fim apoteótico com vários nus no palco.

A reação foi um público “delighted” e uma crítica na revista Rolling Stone dizendo que, em comparação àquilo, o que havia acontecido nos dias anteriores era simples “psychedelic muzak”. A primeira nota na imprensa americana a respeito de Caetano e Gil.

Quando fomos à Bahia há pouco, Caetano comentou que lembrava detalhes da nota na Rolling Stone de memória, mas nunca mais a tinha visto, que aquilo tinha que ser encontrado. Aceitando o desafio, Paulo Terron, editor da RS brasileira, fez a busca e encontrou:

Via.

(Foto daqui.)